Gerações

As queridas mãos

Joia rara: o coronavírus narrado pelo próprio autor

Aqui estão vocês, minhas queridas mãos, sempre prontas, solícitas, dóceis e competentes. Agora mesmo, quando escrevo estas palavras, vocês trabalham, ágeis e prestativas, percorrendo o teclado.

Eu as contemplo e penso que vocês, muito mais do que ossos, músculos, cartilagens e pele, são os instrumentos por excelência de nosso contato físico com o mundo.

Aprender a usar vocês é um dos desafios mais difíceis, porém compensadores, desde que nascemos.

Sua capacidade preênsil, ou seja, de pegar, agarrar, manipular, é um milagre. O chamado “polegar opositor” é um dos presentes mais preciosos que a Vida nos dá.

Adoradas mãos, vocês são a mágica extensão que leva nossos corações e mentes ao contato com o mundo. Tocar, segurar e manipular dependem de vocês – e disso dependem a escrita, as artes, as ciências, a manufatura…

Ah, e nos gestos, mãos adoradas, como dependemos de vocês, para usar a linguagem corporal, indispensável a qualquer comunicação em que de fato empenhamos toda a nossa alma.

Mãos, mãos, sensíveis mãos, o que dizer de vocês quando nos representam nos carinhos do amor e nas carícias da paixão?

Ou, quando suas extremidades, os dedos, se empenham no acarinhar a cabecinha de filhas, filhos, netos?

Ou, ainda, quando possibilitam todos os afagos, inclusive compondo a complexidade maravilhosa, e tão humana, do abraço.

Hoje mesmo, insuperáveis mãos, quando um vírus terrível nos assola, são vocês, quando pertencentes a médicos, pesquisadores e a todo o pessoal de saúde, as responsáveis por todos os contatos com os doentes, desde os gestos e procedimentos técnicos aos carinhos que permeiam as relações desses abnegados profissionais com seus pacientes.

Agora juntas, palma com palma

Queridas e insubstituíveis mãos, nem sempre nos lembramos de vocês, nesse mundo de correrias, em que a plena atenção é um artigo raríssimo. Agora, com a pandemia do coronavírus, numa grande ironia, precisamos cuidar de vocês, como talvez jamais tenhamos cuidado.

É imperioso, maravilhosas mãos, que banhemos e higienizemos vocês, demoradamente, após cada contato potencialmente perigoso. E isso sem as invencionices de fórmulas e receitas disseminadas, como um vírus da ignorância e do pavor, que pululam nas redes sociais.

Apenas água e sabão, ou álcool em gel, como aconselham os especialistas sérios e responsáveis, deverão ser as essências com as quais limparemos, carinhosa e cuidadosamente, vocês, inigualáveis mãos.

Suas coirmãs, as mãos dos profissionais da Saúde, essas serão abençoadas, porque são heroínas nessa guerra sem fronteiras contra a terrível covid-19. E todos orarão e meditarão por aquelas que já tombaram para sempre por pertencerem a destemidos guerreiros de branco.

Tenhamos calma e paciência, queridas mãos. Logo, logo nossa quarentena findará e virá a hora em que os apertos de mão e os abraços em todos voltarão, deixando apenas uma lição dura e amarga a ser aprendida, pois sofrimentos sempre ensinam.

Desculpem, adoradas mãos, por não podermos usar, mesmo com as pessoas que mais amamos, seus insubstituíveis recursos.

Por enquanto, minhas queridas mãos, junto-as, agora, palma com palma, pela saudade dos que se foram e pela esperança e confiança de todos os que estão sofrendo, contaminados ou confinados.

Namastê!

Então. Pois. Então. Pois. Então.  

 Então. Pois. Então. Pois. Então.

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Então. Pois. Então. Pois. Então. 
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Então. Pois. Então. Pois. Então. 

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Jota Carino

Professor aposentado da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), com formação em sociologia e filosofia; é escritor e membro da Academia Fluminense de Letras, cadeira nº 20; tem vários livros publicados, de crônicas e de contos, e brevemente publicará seu primeiro livro de poesia

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