Meu avô, meu ídolo, meu norte e meu pai
► Antes de começar esse texto, gostaria de esclarecer algo sobre meu avô, meu ídolo e também ídolo de muita gente. Ele possuía uma “casca” e era assim que muitos o enxergavam: um homem negro, elegante, de postura rígida e muito sério.
A vida esportiva, além de ser normalmente regrada, lhe presenteou com um treinador alemão chamado Dietrich Gerner, e a fama dos germânicos é essa.
Mas, como disse, isso é apenas uma casca. Adhemar, da porta para dentro, foi mais que um avô. Foi um pai. Um pai que me encheu de amor, ensinamentos e companheirismo.
Inúmeras lembranças, como brincadeiras de cavalinho, jogos de dama e tabuleiros em geral, e, depois de brincar comigo, ele sempre dizia: “um beijo e um queijo!”
Meu avô sempre carregou a imagem do Brasil, em todos os lugares do mundo em que ele foi. Viveu a vida pelo esporte e pelo bem estar social. Projetos sociais, trabalho como funcionário público, coordenação esportiva de uma universidade… Ufa!
E, ainda assim, achava tempo para brincar, perguntar como foi o meu dia.
Adhemar atleta e profissional viajava muito. Passava mais tempo fora do que dentro de casa, vivendo para o esporte.
As pessoas sempre chegavam pra mim e diziam: – Uau, neto de um bi campeão olímpico! – Seu avô foi o maior atleta do Brasil, um gênio!
Mas confesso que só tive essa noção depois do seu falecimento, em 2001. Depois que ele faleceu, tomei consciência do quão difícil era trabalhar, treinar e dedicar seu tempo para levar a bandeira brasileira ao lugar mais alto do pódio.
O quão difícil é você viver em um país racista… e se destacar. Cinco faculdades, nove idiomas fluentes, homenagens, solenidades, viagens…
Hoje, tenho total noção de tudo isso. Mas, na época, eu o admirava apenas por ser o meu avô, que chegava em casa depois do trabalho, brincava com jogos de tabuleiro comigo e dizia: “um beijo e um queijo!”
Legal, né? Melhor que qualquer medalha olímpica era ouvir antes de dormir: “um beijo e um queijo!”
Sobre o avô
Adhemar Ferreira da Silva é até hoje o único brasileiro no Hall da Fama da Federação Internacional de Atletismo. Durante 48 anos foi único brasileiro a ser bicampeão olímpico.
Conquistou as medalhas de ouro no salto triplo nos Jogos de Helsinque em 1952 e de Melbourne em 1956. Bateu várias vezes o recorde mundial e o recorde olímpico. Sua melhor marca foi obtida nos jogos Panamericanos da Cidade do México em 1955, e permaneceu como recorde mundial por cinco anos.
Três curiosidades sobre sua carreira:
♦ para agradecer aos aplausos do público, após bater o recorde mundial em Helsinque, em 1952, ele inventou, involuntariamente, a “volta olímpica” porque deu uma volta completa em torno do estádio;
♦ as duas estrelas douradas no escudo do São Paulo Futebol Clube, presentes até mesmo nos uniformes de futebol, representam o bicampeonato olímpico de Adhemar;
♦ sua primeira medalha de ouro quebrou a sequência de 32 anos em que o Brasil não ganhava um ouro, depois de Guilherme Paraense, campeão olímpico de tiro esportivo nos Jogos de Antuérpia em 1920.
Com talentos múltiplos, dedicou-se à música e, como ator, atuou, em 1954, na peça Orfeu da Conceição, de Vinícius de Moraes, com música de Tom Jobim, e no filme franco-italiano Orfeu Negro, vencedor da Palma de Ouro no Festival de Cannes de 1959, e do Globo de Ouro e do Oscar, na categoria melhor filme estrangeiro, em 1960.
Tinha facilidade para aprender línguas e chegou a dominar nove idiomas. Ocupou o cargo de adido cultural do Brasil na Nigéria de 1964 a 1967 (foi nomeado pelo presidente João Goulart).
Também foi muito dedicado aos estudos e formou-se como escultor pela Escola Técnica Federal de São Paulo (1948), em Educação Física pela Escola do Exército, em Direito pela Universidade do Brasil (1968), e em Relações Públicas pela Faculdade de Comunicação Social Cásper Líbero (1990).
Adhemar nasceu em 1927 no bairro de Casa Verde, na cidade de São Paulo, onde faleceu em 2001.
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