Gerações

Sentimentos iguais e diferentes

Milton Leite e seu neto Ângelo, que veio ao mundo para brilhar: chegou com um grito de gol durante uma partida de futebol

► Pensei em começar o primeiro texto que escrevo sobre Ângelo pela forma inusitada como recebi a notícia do nascimento e como ela foi transmitida imediatamente em rede nacional. Ou pelas conversas que ele desenvolve aos 14 meses com um vocabulário próprio, no dialeto dos bebês. Talvez com o dia em que minha filha contou que estava grávida. O primeiro vídeo que recebi dos primeiros passos…

A dificuldade em escrever o primeiro parágrafo escancarou quão intenso foi esse pouco mais de um ano de convívio. Percebi que todo mundo, em algum momento, espera e até se prepara para ser avô. Mas quase todos chegamos lá sem ter ideia do que isso envolve – o sentimento, muito mais do que cada gracinha ou aprendizado.

Acompanhei o crescimento de três filhas. Não deveria ser surpresa, portanto, o desenvolvimento do meu neto. Mas no primeiro dia em que o colinho do vovô fez Ângelo adormecer as coisas ficaram mais claras. Aquela cabecinha recostada no meu peito, a mão gorduchinha pousada sobre a minha pele e a respiração calma, compassada. Algo novo estava acontecendo.

Diz minha terapeuta que os momentos do pai e do avô, separados por mais de 30 anos, fazem toda diferença, o sentimento é outro. Não é maior, não é melhor. Aos 20 e poucos anos, com uma família para criar, carreira para desenvolver, mais contas que o salário suportava, ansiedade e medo em torno de tanta novidade! Tudo isso relembrado agora, parece ter sido tão difícil, tão veloz.

Atualmente, com a serenidade dos 56, estou a redescobrir o que já conhecia, sem a necessidade de ter de sair amanhã cedo para matar mais um leão. Posso desfrutar de cada momento com calma – e com a ajuda da tecnologia, que via celular informa quase em tempo real o que se passa na vida do garoto loirinho, com fotos e vídeos em profusão.

Milton Leite e Angelo 770 - 2

Lembro com clareza do dia em que recebi a visita pouco usual de minha filha Gabriela num meio de semana (moramos em cidades diferentes, separadas por 40 minutos de carro). Colocou em minha mão um rolinho de papel, amarrado com um fita, como se fosse um diploma. Com a frase: “Parabéns, vovô”. Começava uma nova etapa. Avô!

Não concordo com os que dizem que ser avô é melhor do que ser pai (“quando começa a chorar, devolvo para a mãe”, brincam). É tão bom quanto. São sentimentos díspares que o conflito ansiedade/serenidade explica. Diferentes formas de amor. Insubstituíveis, complementares, incondicionais.

Para matar a curiosidade que provoquei no primeiro parágrafo: dia 6 de junho de 2014, na minha função de narrador esportivo do Sportv, estava no Estádio do Morumbi para transmitir o amistoso entre Brasil e Sérvia, preparação para a Copa do Mundo que começaria uma semana mais tarde. Algumas horas antes, Gabriela ligou avisando que estava indo para o hospital, tinha tido um sangramento, mas que o médico não acreditava que o parto aconteceria naquele dia. Quando o jogo terminou, ainda com a transmissão em andamento (entrevistas no campo, comentários pós-jogo) liguei meu celular, em busca de notícias da minha filha.

Fotos foram aparecendo, direto da sala de parto. Fazia menos de dez minutos que Ângelo havia nascido. Maurício Noriega e Juliano Belletti, meus companheiros na transmissão, se encarregaram de anunciar a chegada do bebê como se fosse um gol (e que golaço!), com direito àquela bolinha no canto da tela. E ainda fizemos um “embala nenê” ao vivo, em rede nacional (como Bebeto na Copa de 94, lembra?). Ângelo veio ao mundo para brilhar e já nasceu como pop star.

 

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Milton Leite

Jornalista, narrador esportivo do canal SporTV e avô de Ângelo e Serena

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6 Comentários

  1. Miltão (não é assim que os Amigos te chamam?), boa tarde. Fui avô pela primeira vez depois de quase 60 anos de vida. Pela segunda vez após os 60. E os dois – Beatriz e Murilo – ficaram aqui em casa, com a vovó (principalmente) e o vovô todo o primeiro ano de vida de cada um. Só depois eles foram para a escolinha. Há 4 anos eles foram levados com os pais para os EUA. E o sofrimento só não é maior por conta do Skype. Ainda ontem lembrei bastante do pequeno Murilo, a quem eu digo que “amo de montão”: primeiro durante a reportagem do Globo Esporte SP com os sub-9 do meu Corinthians; depois, durante o jogo do Goiás, no Morumbi, todas vez que ouvia o narrador do SporTV falar bem do Murilo. Mesmo assim, Miltão, não quero que ele seja jogador de futebol (ou quero?). Acho que o vovô babão+bobão não iria aguentar as fortes emoções. Até porque ele vive me perguntando: “Vovô, e o Timão ganhou”. E quando o Corinthians perde? Você acha que tenho coragem de dizer a verdade? Parabéns, Vovô Miltão.

  2. Flávia é minha neta. Tem 9 anos. Reside comigo porque a mãe estuda em outra cidade. Há 7 anos escrevo crônicas , inspiradas nela. Sobretudo no que ela fala. Já tenho conteúdo p/ um interessante, e, bastante divertido livro. Aguardo momento financeiro oportuno p/ publicá-lo, uma vez que prover filhas que fazem fazem faculdade fora, é compromisso maior meu, no momento. Enquanto isso, continuo escrevendo as “pérolas” da minha neta. Sucesso nos seus registros. Continue! Um gde abraço.

    1. Angela Rosa, muito obrigada pelo comentário. Você é convidada pelo portal avosidade para publicar um dos textos que escreveu inspirados na sua neta Flavia, para sair no canal “vô escreve”. Por favor, envie seu texto para o e-mail elisabete@avosidade.com.br. Continue conosco.

  3. Parabéns vovô pelas lindas palavras! É isso mesmo: os netos são presentes que recebemos sem esperar. Delicioso ser avó. Tenho quatro netinhos e um a caminho. A família é o que existe de mais importante na nossa vida com a chegada dos netos a vida torna-se iluminada e mais feliz. Que venham outros mais netinhos!!

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