Gerações

Dois umbigos

O neto Rafael com o autor, que qualifica como “um prazer inenarrável” a missão dos avós de ajudar os filhos a cuidar dos filhos deles

● ● Um é metafórico e o real é aquele ‘cotoquinho’ dos bebês

► Estamos num mundo em que, para a maioria das pessoas, o centro de tudo é… o seu próprio umbigo. Aliás, essa imagem, tão comum desde os tempos de nossos avós, é atualíssima. Ou será que as selfies não são a própria expressão de um tempo que a todos transforma em narcisos? O primeiro dos umbigos é esse, metafórico.

Nada contra esse massageamento do ego, essa necessidade exacerbada de aparecer em autofotos feitas com o celular, incrível aparelho onipresente em nossas vidas. Mas o objeto principal desta crônica é o segundo dos umbigos, o umbigo real, que quase todos temos, com raras exceções, e que nada mais é, segundo os dicionários, que “uma cicatriz localizada na região central do ventre, decorrente do corte do cordão umbilical”.

Ao que tudo indica, segundo essa definição, o nosso querido umbigo não serve para nada. Mas o umbigo, quando localizado na barriguinha de bebês, o lugar onde vemos um cotoco de cordão umbilical, esse, interessa muito a mães, pais e avós.

Não há dúvida de que o cuidado com esse pedaço de cordão umbilical, remanescente após o nascimento, é imprescindível. Sobre isto não me manifesto, mesmo porque é matéria para os especialistas em puericultura. Meu interesse recai sobre os avós, esses “repaginados” pela vida com uma nova missão de duas faces.

E dois universos umbigos

A primeira dessas faces nem pode ser chamada propriamente de missão. É um prazer inenarrável misturado com a missão de ajudar os filhos a cuidar dos netos. Aliás, não é à toa que se diz: pais são para educar, avós, para “estragar”.

Claro que essa frase deve ser só uma frase. Afinal, aos pais evidentemente incumbe educar seus filhos, com a palavra “educação” entendida como aquilo que diz respeito a ensinamentos recebidos no seio da família, no âmbito da vida privada. Outras instâncias de educação pertencem à esfera da vida pública, como a própria escola.

Deste ponto de vista, os avós me parecem pertencer a esses dois universos de relação, pois são participantes da vida privada, como parentes absolutamente próximos, muito próximos, que estão ali presentes na vida privada da família, mas que, a meu ver, e segundo muitos especialistas, devem agir como agentes “de fora”, ou seja, que juntam sua experiência do que viveram com seus filhos, com sua vivência da vida toda, com seus erros e acertos.

Umbigos

Em suma, avós têm (ou devem ter) “um pé lá, outro cá”: próximos como são, pelos laços do amor, porém guardando distância que os impeça de imiscuir-se na relação de seus filhos com os próprios filhos e na maneira de criá-los e educá-los.

Pedindo perdão pela digressão, volto ao umbigo.

“Curar” os umbigos

A segunda das duas faces a que me referi acima diz respeito à realidade concreta, mais precisamente àquele resquício de cordão umbilical, situado nas barriguinhas encantadoras de seus netinhos.

Avós, por mais egocêntricos que possam ser, transferem sua atenção de seu próprio umbigo para o dos netos. Inclusive literalmente. Aquele cotoquinho pode tornar-se objeto de um cuidado exacerbado.

Por mais que tenham cuidado dos próprios filhos quando bebês, avós podem exagerar, pois, afinal, “são filhos de outras pessoas”, mesmo sendo tais pessoas seus próprios filhos. O cuidado com o umbigo não foge à regra.

Dar banho num neto é um caso típico dessa atenção redobrada. Será que se pode molhar ao higienizar o cotoquinho? E se, no movimento de limpar o pequenino ventre, toca-se a extensão de cordão e ela cai, isso é motivo de preocupação?

Sei que essas dúvidas assaltam os avós, e muitas vezes até àqueles bem experientes, porque as formas de se “curar o umbigo” – como se dizia antigamente – são hoje bem diferentes, em decorrência, inclusive, dos avanços da medicina. Não obstante creio ser útil mencioná-las nesta despretensiosa crônica, aproveitando para confessar minhas próprias dúvidas.

Oxalá muitos outros avós possam refletir sobre esses “dois umbigos”. De qualquer modo, vejo com muita alegria que, hoje em dia, a imensa maioria dos avós, inclusive auspiciosamente avós jovens, prefere cuidar dos umbigos de seus netinhos que ficar contemplando e girando em volta de seus próprios umbigos. Reais ou metafóricos.

Então. Pois. Então. Pois. Então. Pois. Então. Pois. Então.

Então. Pois. Então. Pois. Então. Pois. Então. Pois. Então.

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Então. Pois. Então. Pois. Então. Pois. Então. Pois. Então.
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Jota Carino

Professor aposentado da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), com formação em sociologia e filosofia; é escritor e membro da Academia Fluminense de Letras, cadeira nº 20; tem vários livros publicados, de crônicas e de contos, e brevemente publicará seu primeiro livro de poesia

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