Comportamento

Dra. Elaine: relação mãe e filha

● A mãe narcisista constantemente ignora a dor de sua filha

A especialista nos conta que, às vezes, para atender as próprias carências, uma mãe pode ter atitudes perversas

Nem sempre as relações familiares são boas e isso acontece também na relação entre mães e filhas. No filme “Sonata de Outono”, de 1978, com roteiro e direção de Ingmar Bergman, vemos a conturbada relação entre mãe e filha, em que o amor não se conjuga.

Como em qualquer outro relacionamento, a relação entre mãe e filha também apresenta aspectos negativos, embora esse relacionamento seja fundamental para o desenvolvimento da identidade feminina de ambas.

Mães e filhas apresentam movimentos de distanciamento e aproximação ao longo do tempo. A relação em geral está sujeita a dificuldades, entre elas há o conflito e a agressividade.

O cotidiano é pautado por atividades compartilhadas e não compartilhadas e a comunicação, ao mesmo tempo em que mantém o relacionamento, também causa percalços, revela e esconde.

Muitas vezes a filha representa para mãe uma “segunda chance” de realizações que não foram possíveis quando jovem e, assim, podem surgir expectativas irreais na mãe em relação ao que esperar de suas filhas em determinadas épocas da vida.

A filha de mãe narcisista nunca tem nada de bom para oferecer ou contribuir em seu relacionamento com a mãe.

Independentemente de sua idade, estágio de desenvolvimento, experiência ou know-how ou seu intelecto, ela é sistematicamente menosprezada, suas habilidades e talentos são ignorados ou descartados e seus argumentos são rejeitados sem ao menos serem devidamente considerados.

O relacionamento com a mãe narcisista só “funciona” quando a filha se submete ao seu controle e manipulação psicológica. A mãe narcisista sempre acha que trabalha mais, que o sofrimento dela é legítimo e o do outro, não.

Atender as próprias carências

Muitas vezes, é hipersensível, por tudo se magoa, se fere. Cria suas próprias regras, exige excessivamente respeito e nunca pede desculpas. A mãe narcisista não amadurece e não evoluiu emocionalmente, não consegue se doar.

Elas não possuem capacidade cognitiva de ter empatia ou de amar, não conseguem avaliar e reconhecer os próprios erros, pois para esconder a sua real identidade, criam um mundo fictício, em que se enxergam perfeitas, sem falhas ou defeitos.

As mães narcisistas costumam culpar suas filhas por sua frustração e infelicidade. Como são egoístas e egocêntricas, recusam-se a reconhecer quando a filha precisa de ajuda ou apoio emocional.

A mãe narcisista constantemente subestima e ignora a dor de sua filha, enquanto insiste que a filha se dedique incondicionalmente a atender suas próprias carências.

Não há diferença óbvia entre a criança e sua mãe e suas necessidades e expectativas são as mesmas que as de sua mãe. É por isso que a criança cresce pensando que todo mundo pode pedir qualquer coisa a ela, e ela deve obedecer, mostrando um alto grau de codependência.

A codependência gera o medo do abandono por parte dos parceiros e o medo da rejeição faz com que quase todas se sintam desconfortáveis.

As meninas na idade adulta se sentirão inseguras quanto à capacidade de manter relacionamentos fortes e saudáveis. Filhas de mães narcisistas exacerbam a sensibilidade da rejeição com dificuldades em tornarem-se autônomas.

A mãe narcisista não deixa nenhum deslize passar em branco, inclusive, mantém um banco de dados das falhas de comportamento daqueles com quem se relaciona.

Atitudes perversas, frias e cruéis

Cada vez que a filha se recusa a atender suas vontades ou a acusa de agir de forma imprópria, ela acessa a memória para exemplos passados de “mau comportamento” e fornece uma longa lista das inúmeras vezes em que a filha a desapontou.

Por outro lado, tem uma memória fraquíssima referente aos sucessos, conquistas e qualidades dos outros, principalmente quando são pessoas pelas quais se sente ameaçada, como a própria filha.

Filhas de mães narcisistas crescem em um contexto familiar de agressividade, desamparo, manipulação e culpa pelas emoções dessas mães que se sentem em posse permanente das filhas. É uma relação comprometida por atitudes perversas, frias e cruéis.

Devido a esses obstáculos e às frustrações que causam, essas pessoas, na idade adulta, podem recorrer ao abuso de álcool e drogas, jogos compulsivos, distúrbios alimentares, distúrbios do sono, dificuldades de tomar decisões, parecem gastar dinheiro compulsivamente e sofrer ataques de pânico como mecanismo de defesa de seu sofrimento.

Manter o relacionamento com a mãe narcisista afeta a capacidade da filha de crescer e se desenvolver como pessoa, assim como lidar de uma vez por todas com os efeitos do trauma, tal como a ansiedade, culpa, raiva, baixa autoestima.

Sentimentos de intensa tristeza/depressão: falta de entusiasmo pela vida, incapacidade de se sentir feliz e contente, incapacidade de desfrutar os pequenos prazeres da vida, sentir que você não pertence a lugar algum ou sentir que tem inabilidade de se conectar com a vida, viver apenas em “piloto automático”.

É preciso o apoio de um profissional de psicologia (para mãe e filha) para que essas relações não causem mais traumas para uma vida toda e para que ainda haja tempo de reconciliação.

Imagem: Getty Images

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Então. Pois. Então. Pois. Então. Pois. Então. Pois. Então. Pois. Então.
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Dra. Elaine Di Sarno

Psicóloga e Neuropsicóloga, mestre em Ciências pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), especialista em Terapia Cognitivo Comportamental

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